quinta-feira, 10 de setembro de 2009

DE QUE LADO ESTÁS, ARIEL?

O autor português Boaventura de Souza Santos faz uma analogia da obra de Shakespeare a tempestade, na qual se depara entre figura de Ariel, um escravo de Próspero (Duque de Milão) e também seu preferido e o Caliban, escravo tanto quanto Ariel, porém nascido na ilha, sem origem européia, um sujeito deformado e mal tratado por Próspero.
Ambos são escravos, porém Ariel tem um tratamento muito diferente de Caliban e também por isso tem uma visão muito diferente da figura de Próspero, o qual lhe promete a liberdade caso ele seja sempre um servo fiel.
O Caliban está amarrado ao Próspero de uma forma brutal, tensa, se odeiam, mas dependem um do outro. Já Ariel não, respeita Próspero e acredita que se for um servo fiel terá a sua liberdade.
Eis o grande paradoxo brasileiro: seremos nós Ariel? Fiel servo de Próspero (na figura norte americana e européia), na esperança de que tal servidão nos trará a liberdade? Ou servimos Próspero diante do medo de termos o mesmo tratamento de Caliban?
Ainda que nossa serventia pareça agradar mais ao Próspero do que ao Caliban, não conseguimos deixar de identificarmo-nos com a servidão de Caliban. É a escravidão que nos une e não a liberdade!
Afinal de contas de que lado estás, Ariel? Do Caliban, que é tão escravo quanto tu? Ou de Próspero que te escraviza?
As soluções econômicas que estamos a acreditar parecem circular ente Próspero e Caliban, com uma dificuldade imensa em posicionarmo-nos entre amo e escravo, ou entre escravo e escravo. Ou, ainda, de encontrar uma alternativa mestiça, própria e autêntica.
No entanto, as alternativas para as questões políticas, econômicas e democráticas, parecem a contentar mais ao Próspero do que o Caliban.
O Brasil tem utilizado sua possibilidade produtiva, seu peso econômico e populacional para tentar adquirir um peso maior no conceito de Próspero. Atua isoladamente na esperança da liberdade, discriminamos nossos companheiros Latino Americanos, tão escravos quanto nós, para termos um conceito melhor com o amo. E isso é possível perceber quando reproduzimos os discursos europeus e norte americanos e tentamos demonstrar a Próspero o quão diferente somos de Caliban.
Também é possível perceber nas idéias dominantes que as pessoas têm sobre o desenvolvimento local, nas quais prevalecem conceitos de progresso compreendido desde as concepções hegemônicas eurocêntricas, cujo progresso é sempre (re)produzido em defesa de Próspero e não de Caliban. O desenvolvimento tem sido entendido a partir da idéia de que devemos dar incentivos para Próspero, assim o Caliban continuará a ter trabalho, mas não deixará de ser escravo!